
Anísia Lima de Sousa

As mãos que criam, criam o que?
“Nosso artesanato é uma cultura muito antiga que minhas avós aprenderam com suas mães, passaram pras suas filhas e que eu aprendi com minha mãe e que já passei pras minhas filhas e já estou querendo passar pros meus netos. Então pra mim é uma tradição muito importante que não pode acabar”.
Anísia modela bonecas variadas, filtros de barro e peças de decoração. O barro é coletado na comunidade e a tinta que utiliza é natural de origem mineral. Para a pintura de flores e penas, utiliza penas variadas, e depois de pintadas, as peças são queimadas em forno a lenha.
Quem cria?
A modelagem do barro para Anísia Lima de Sousa começou como brincadeira, quando aos 8 anos de idade, ficava ao redor de sua mãe ceramista, fazendo suas primeiras peças. Filha de lavradores, desde criança Anísia acompanhava o pai de manhã cedo e a tarde nos arrozais, para espantar os bichos e proteger o roçado.
Aos finais de semana ia com a mãe até a feira de Capelinha, município próximo, para vender o artesanato. Saíam por volta de 2 horas da madrugada, pois não havia estradas na comunidade e precisavam caminhar até o ponto onde seguiam viagem na carroceria de um caminhão.
A família vivia da lavoura e o que não plantavam, compravam com o dinheiro do artesanato. Anísia se casou e seguiu trabalhando no roçado e com o artesanato. Com 3 filhos para criar, o esposo decidiu buscar trabalho fora e chegava a ficar um ano longe da família. Anísia seguia em Campo Alegre, cuidando da roça, dos filhos e do artesanato. Hoje, o esposo não precisa mais ir buscar trabalho fora e Anísia segue trabalhando com a lavoura e o artesanato. Passou seu conhecimento para as filhas que também a ajudam.
Onde cria?
Campo Alegre é distrito de Turmalina, alto do Jequitinhonha. O artesanato com a cerâmica nasceu na comunidade e foi levado mais tarde para Coqueiro Campo, outra comunidade próxima, pelas mulheres que para lá se mudaram. Assim, as artesãs das comunidades possuem laços estreitos umas com as artesãs e muitas são parentes ou possuem a mesma origem familiar, o que explica a grande semelhança do artesanato produzido nos dois locais. As técnicas utilizadas pelas artesãs sãos as mesmas e a estética possui as mesmas características.
A comunidade fica no Alto Jequitinhonha, próxima ao rio Fanado. A região, antes coberta por mata atlântica e habitada pelo povo indígena Aranã, foi ocupada no século XVII pelos vaqueiros que buscavam terras para pastagem. Grande parte da mata foi derrubada e o que ficou no lugar foi o capim colonião e o solo castigado. Hoje, a principal atividade econômica presente no Vale é o cultivo de eucaliptos pelo agronegócio, que tem trazido consequências graves que atingem as comunidades e o ecossistema, como o desemprego, a crise hídrica, e os impactos na diversidade da fauna e da flora locais.
Nesse contexto, as mulheres têm estado cada vez mais ativas na geração de renda para suas famílias, visto que os homens, desempregados, são obrigados a buscar trabalho em outros cantos, passando longas temporadas fora da comunidade. Antes migravam para trabalhar com o corte da cana, mas com o fim do ciclo dos canaviais, os homens buscam trabalho na construção civil e em madeireiras. Cabe às mulheres, que passaram a ser conhecidas como viúvas da seca, a cuidarem dos filhos, de suas casas, do plantio e de si mesmas. Em Campo Alegre vivem cerca de 200 pessoas e para a maior parte das famílias o artesanato constitui hoje principal fonte de renda.
Rede nacional do artesanato
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