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Bordados do sertão ribeirinho na moda: o intercâmbio entre a marca Foz e as artesãs de Entremontes

Do semiárido alagoano para para nobres endereços da moda autoral em São Paulo, o redendê e outros bordados tradicionais ganham modernidade, elegância e ludicidade nas peças do Ateliê Foz, uma marca que surgiu com a proposta de exercitar a reinvenção de técnicas artesanais ancestrais. Confira a seguir um relato do designer Antônio Castro, idealizador da marca, sobre o processo criativo junto às artesãs de Piranhas (AL)

Antônio Castro


Feita entre Alagoas e São Paulo, Foz é um projeto que explora as possibilidades de diálogo entre o artesanato cultural brasileiro e o vestir contemporâneo, exercitando o encontro entre esses dois universos que se complementam. O olhar sensível para os bordados e outras técnicas que carregam a sutileza do adorno tradicional e original do Brasil profundo é o guia para a criação de produtos que carregam as histórias daqueles que as fizeram em cada ponto e laçada.

Inspirada pelos encontros, assim como indica seu nome, Foz é uma marca que busca, através da troca, o resultado pela soma. Com seu início em dezembro de 2020, a ideia é, na verdade, o desdobramento de um projeto de formação acadêmica que teve seu início em 2017 e amadureceu para se tornar um exercício de co-criação com artesãos como um caminho para possibilidades contemporâneas de uma moda artesanal.

Parte expressiva do desenvolvimento das nossas coleções acontece na pequena Entremontes, vilarejo cravado no sertão alagoano e às margens do São Francisco, onde a paisagem não é só formada por casas e rio, mas pela beleza da gente que vive lá. Em cada calçada, na porta de cada casa, se vê uma bordadeira a contar fios em tecido em um vai e vem de dedos e agulhas que, aos poucos, preenchem a superfície do bastidor. São elas que abrilhantam as fachadas antigas, em panos adornados e cadeiras coloridas, de dia e de noite, entalhando no tecido os desenhos que aprenderam com as mães e ensinam às filhas.

Desenhar os caminhos que o artesanato têxtil pode percorrer e exercitar a reinvenção de técnicas ancestrais através de seu uso no vestuário são as direções que nos guiam em busca de possibilidades contemporâneas para as técnicas que trabalhamos com estes grupos. Essa é a bússola que norteia nossa relação com as mulheres bordadeiras da vila de Entremontes.

Com tecido no colo e agulhas em riste, quase como em uma sinfonia de artistas em ação, operando seus instrumentos, esculpindo melodia em tecido, amarrando no pano o fio das conversas que regam o tempo da borda. À primeira vista, o povoado apresenta seu bordado protagonista, o redendê, mas não se demora a perceber que, muito além deste, as mulheres que bordam pelas calçadas em frente as suas casas dominam muitos outros saberes que se entrelaçam com a história da colonização sertaneja que chegou através do leito do Velho Chico.

Além do redendê, fazem parte do arsenal de técnicas das bordadeiras entremontenses também o boa-noite, o labirinto, o ponto-cruz e até mesmo a renda de bilro. Estes saberes transitam entre os territórios do sertão ribeirinho e se espalham pelos bastidores das mulheres que desenham sobre o tecido as flores e caracóis característicos dos bordados tradicionais.

Foi a partir deste mergulho no repertório dos artesãos do sertão que percebemos a possibilidade criação de um bordado híbrido, que mesclasse pontos de fazeres distintos, percorrendo-se novos caminhos que nos levariam a criações com mais de uma técnica na mesma peça. Assim surgem os nossos primeiros “riscos”, como são chamadas as composições de pontos que adornam os tecidos.

No processo de troca com os artesãos, nossos olhares se ajustam à ótica do outro para melhor entender as particularidades que técnica e desenho permitem no limiar entre tradicional e contemporâneo. O desenvolvimento de riscos computadorizados, através de desenhos que simbolizam os pontos das técnicas locais fornecem um “mapa” do que será desenhado sobre a trama. Através da leitura destes guias, as bordadeiras tecem sobre a cambraia de linho os bordados sertanejos que adornam camisas, chemises, vestidos, entre outros produtos.

É neste processo de intercâmbio de informações e experiências em que construímos uma relação perene, que permite a possibilidade do erro, do questionar e do sugerir, parte importante do processo de desenvolvimento conjunto, em que os artesãos expressam seus olhares sobre o trabalho da marca interferindo nela e sendo sugestionadas por ela também.

Assim como o artesanato, o desenho que surge da colaboração entre designer e artesão é feito de tempo. É através da construção de um elo alimentado por esse tempo que temos a oportunidade de mergulhar cada vez mais profundamente na possibilidade que uma técnica tem ou até mesmo no potencial criativo que um artesão guarda.

As descobertas que fazemos no caminho se transformam em herança do processo de criar. É o que conta Lourdes Bezerra, bordadeira líder do grupo que desenvolve nossos produtos em Entremontes: “o significado desse tipo de trabalho é muito forte para nós artesãs. A iniciativa de misturar os pontos de bordados diferentes nos fez acordar para outras combinações que nunca imaginamos e tivemos a chance de aprender através dessa ação. Já temos outras pessoas de fora que buscam esse tipo de trabalho onde há essa junção de técnicas. E vemos a reação dos clientes sorrindo e elogiando os trabalhos que temos feito.”

Serviço


Os produtos da marca desenvolvidos com as bordadeiras de Entremontes e demais grupos produtivos alagoanos estão disponíveis no site e instagrame também nos endereços físicos em São Paulo (SP):

Bemglô
R. Oscar Freire, 1105

Feira na Rosenbaum
R. Matheus Grou, 513

Rede Artesol


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Antonio Castro é designer de produto e estilista, graduado pelo Centro Universitário Senac. Alagoano radicado em São Paulo, atua na criação de produto com foco no objeto artesanal, a frente de sua marca, além de outros projetos e iniciativas, sempre trazendo a identidade cultural de suas origens em seu repertório de trabalho e valorizando o feito à mão nacional.