Cadeira Paraíba Mulata, desenvolvida pelos Irmãos Campana com bonecas do Grupo Associação de Artesãos de Sítio Riacho Fundo, de Esperança (PB)

No último dia 16, o Brasil perdeu um de seus maiores ícones do design, Fernando Campana, que, ao lado do irmão, Humberto, formou uma dupla que se tornou mundialmente conhecida pela genialidade de suas criações.

Pioneiro em ressignificar objetos do cotidiano com DNA brasileiro, obteve reconhecimento internacional por sua obra, que tem como um dos principais diferenciais a inspiração em técnicas ancestrais de artesanato de diferentes partes do Brasil e do mundo.

“Profundamente enraizado na cultura e nas tradições brasileiras, seu trabalho carrega em seu cerne valores universais, como a liberdade e a dignidade humana, criando sua identidade por meio de experiências de vida. O layout inovador das peças faz parte do processo criativo que eleva itens do cotidiano, como poltronas e cadeiras, à nobreza". As características brasileiras, como a abundância de cores, as misturas e o caos criativo, trazem o triunfo das soluções simples, poeticamente”, cita o site do Estúdio Campana.

Fernando fez parte da história da ArteSol e temos muito orgulho do trabalho que realizamos em parceria. E tudo começou em 1999, com a atuação da ArteSol no município de Esperança, no agreste paraibano, que visava resgatar o artesanato de tradição produzido no território como oportunidade de renda, em um período em que a seca impedia o trabalho na lavoura. Esta ação contribuiu para a criação da Associação dos Artesãos de Riacho Fundo.

A artesãs do município de Esperança, na Paraíba, que projetaram para o Brasil seu trabalho com as bonecas de retalho de pano através do projeto dos Campana

“...tinha uma senhora que fazia na perfeição essas bonequinhas tradicionais no sertão e hoje temos mais pessoas envolvidas, jovens inclusive, que recuperaram esse saber e que estão interessados e que viram que a sua própria arte pode ter uma remuneração”, contou Ruth Cardoso, idealizadora da Artesol, em entrevista realizada no ano 2000 a respeito do projeto das Bonecas Esperança.

“Nós temos um design da qualidade e do reconhecimento dos irmãos Campana e eles se debruçam sobre essa nossa realidade tão cotidiana, e utilizam tudo isso para uma criação absolutamente diferente. Isso só demonstra que nós realmente temos raízes, as raízes estão aqui, nessas bonequinhas e que nós temos também uma maneira muito avançada, muito contemporânea, de olhar para o nosso país e produzir arte, que é o que eles fazem. Nós sempre procuramos esse apoio dos designers para utilização dos materiais tradicionais que a gente traz. Nós temos feito exposições, tentativas. Esta foi a mais reconhecida, a mais visível e a de maior sucesso”, complementa a doutora Ruth.

O designer e arquiteto Fernando Campana, irmão de Humberto Campana, morreu no último 16 de novembro, aos 61 anos

As bonecas de pano habitam o imaginário brasileiro e estiveram presentes nas infâncias de muitas meninas e meninos em muitos cantos do território. São uma herança das etnias africanas que confeccionavam as abayomis, bonecas feitas com retalhos de tecido. Em muitas civilizações, a boneca representa a imagem que se tem do que é um ser humano para aquela cultura. Assim, as artesãs homenageiam, com suas bonecas, os filhos, vizinhos, os pais e avós, honram a memória daqueles que se foram, e deixaram saudades, e dão vida aos personagens que fizeram parte da infância de muitos da comunidade, como os lendários cangaceiros Lampião e Maria Bonita. Também retratam figuras que retratam momentos marcantes em suas vidas, como os noivos, e a festas populares, como a festa junina. Essas figuras ganharam muito mais expressividade depois do trabalho do Estúdio Campana.

Fernando deixa saudade e uma marca indiscutível no cenário do design autoral brasileiro.

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Sobre o autor

Mariana Maria

Mariana Maria é comunicadora e especialista em marketing. Atua como produtora de conteúdo e consultora em projetos de branding, apaixonada por conhecer e contar histórias inspiradoras.