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No tempo do Xingu, que não poderia ser mais contemporâneo

Durante o processo de produção do Projeto Arte dos Mestres, o diretor audiovisual Theo Grahl fez um mergulho na vida do Parque Indígena do Xingu para documentar a produção de artefatos rituais e cotidianos que farão parte da Mostra, que é um evento-manifesto pela valorização dos mestres artesãos brasileiros

Theo Grahl


Fotos: Theo Grahl / Edição: Camila Fróis

A mostra Arte dos Mestres é um evento que será realizado pela Artesol, de 30 de agosto a 03 de setembro de 2023, com o patrocínio do Instituto Cultural Vale, na capital paulista. A proposta é promover o reconhecimento dos mestres do artesanato brasileiro e sua arte, sua história de vida e a importância simbólica dos objetos que produzem, bem como o seu legado para as comunidades e para o patrimônio imaterial do país.

Confira o relato dessa imersão do diretor audiovisual da Mostra, Theo Grahl, no Xingu, para documentar a história de alguns mestres artesãos que terão sua peças na exposição:

Diário de Bordo | Projeto Arte dos Mestres | Expedição Xingu

O que mais me marcou na experiência durante esses 7 dias de expedição Xingu para produzir um minidocumentário para o projeto Arte dos Mestres, da Artesol, foi a oportunidade de aprender a viver no tempo das coisas, na convivência com a terra, com a natureza e com seus verdadeiros guardiões.

Partimos de São Paulo de avião até Cuiabá (MT), onde tivemos um voo (que faríamos até Água Branca-MT) cancelado. Seguimos, então, por mais de 10 horas de asfalto, em que nos perdemos e nos achamos, até chegar em Gaúcha do Norte (MT). De lá, foram mais 7 horas de estrada de terra até a aldeia Waurá, onde iniciaríamos nossa imersão pelo Parque Indígena do Xingu guiados pelo fotógrafo Piratha Mars.

Ali, além de documentar histórias emocionantes sobre a relação de diferentes etnias com sua produção artística e simbólica, aprendemos sobre seus hábitos e suas práticas no dia a dia: a pesca, o fogo aceso para esquentar as manhãs muito frias, o idioma que se mantém vivo, apesar da aproximação do homem branco, o almoço com o peixe fresco e o beiju feito da mandioca colhida, triturada à mão e seca ao sol.

A produção artesanal também se integra ao às cenas, à rotina e ao tempo dali que, apesar de ser um tempo próprio, não pode ser mais atual. Com uma produção que transita entre o cotidiano e o ritualístico, os povos indígenas do Xingu resistem através de sua arte, que inclui toda a sorte de objetos, artefatos, cerâmicas, tecelagens e pinturas produzidas com materiais da biodiversidade amazônica. Se tantas técnicas e saberes tradicionais suportaram as influências dos não indígenas, preservando-se e atualizando-se ao longo de tantas gerações, por que não entender tais expressões como contemporâneas? Vale lembrar que o modo de se relacionar, interagir com a natureza local, se expressar artisticamente ali se pauta por valores como coletividade, repeito aos ciclos da natureza, colaboração, regeneração e originalidade. Existem valores mais contemporâneos?

Vestimentas para festejos, máscaras ritualísticas e cheias de significados, artefatos para o uso rotineiro na coleta, na caça e nas refeições coletivas aliam funcionalidade e beleza, ao mesmo tempo que são reconhecidas como objetos de arte e design, preservam sua dimensão religiosa e simbólica. Alguns são esculpidos em formato de animais da floresta, outros são decorados com grafismos ou coloridos com pigmentos diversos, outros ainda são bordados com simbologias sagradas. Desta forma, todos espelham o universo cultural, a cosmologia e poesia das etnias que os criam.

A poesia e a calmaria que embalavam os dias à beira do rio, porém, não são sinônimo de uma vida sem apuro. Um dos caciques que nos recebeu no território Waurá contava sobre a urgência de se ampliar a demarcação de suas terras, porque o Rio Xingu, que garante a vida por ali como ela é, nasce em um território que ainda não faz parte da terra indígena. Como consequência, a água tem chegado envenenada na aldeia, em função do avanço do agronegócio sobre fronteira amazônica.

Por isso, entender o Xingu, falar sobre o Xingu, defender o Xingu e revelar sua arte pro mundo é também defender a diversidade, o direito à vida, à criatividade e à liberdade de ser exatamente aquilo que se é.

Rede Artesol


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Theo Grahl é fotógrafo, videomaker e idealizador da Mombak Coletivo. Ama ouvir histórias e, a partir delas, contar essas histórias através de imagens e sons! Apaixonado pela cultura tradicional!

Camila Fróis é jornalista, dedicada a a cobrir pautas da área de cultura popular, meio ambiente e direitos humanos.