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O tempo do homem e olhar para o pequeno

Na coluna “Inspire-se” desse mês, Paula Dib reflete sobre como as nossas relações de consumo dizem sobre o nosso modo de estar no mundo. Para Paula, consumir é investir energia e cada um pode escolher onde colocar a sua. Seja nos grandes ou nos pequenos produtores, somos todos co-responsáveis pelas cadeias que ativamos.

Paula Dib


Fotos: Paula Dib

Já tem um tempo que comecei a ver o dinheiro como energia, sim, daquelas que a gente coloca nas coisas e na vida. Dessa forma, a cada vez que vou usar o meu, posso usar também o meu poder de escolha e colocar “energia” no que quero de fato ver acontecer.

Essa mudança de pensamento parece pequena, mas me trouxe uma consciência especial para o ato corriqueiro de comprar. Veja: colocando minha força, me torno um elo e sou corresponsável (para o bem e para o mal) pela manutenção de determinada atividade. Claro que isto sempre esteve implícito, mas para mim as coisas ficaram mais claras quando comecei a olhar para aquela nota de papel ou cartão de plástico pensando no poder que eles têm.

Exercendo minha escolha, elejo (sempre que possível) produtores que escolheram fazer à mão e em pequena escala. Seus corpos e suor são parte de um processo vivo no qual se produz o de comer, o de vestir e o de rechear nossas casas.

E assim, mudei não só meu modo de consumir, mas resolvi atuar para que mais gente tivesse condição de escolher o pequeno. Sou uma designer que tem o privilégio de trabalhar há 15 anos com produtores de objetos artesanais, Brasil adentro e mundo afora.

Recentemente, participei de uma iniciativa muito bacana da Artesol –Rede Nacional do Artesanato Cultural Brasileiro, uma organização com mais de 20 anos, fundada pela ex-primeira-dama Ruth Cardoso. Ali, o Brasil que antes poucos tinham o privilégio de conhecer, está acessível para todos. Criamos um extenso catálogo de mestres, artesãos e grupos produtivos espalhados do Oiapoque ao Chuí. Me orgulho muito de fazer parte da equipe (apaixonada e caprichosa) que se empenhou em fazer do pequeno produtor uma opção mesmo para quem está longe.

E hoje, não há desculpa: já existem inúmeras iniciativas que se propõem a trazer aos nossos olhos esses pequenos grandes produtores. São feiras, eventos, institutos e plataformas que, cada um ao seu modo, fazem desses artesãos uma opção pra todos nós. Portanto, está em nossas mãos fazer valer nosso poder de escolha e oferecer nossa energia (aquela) para um produto que não acaba no objeto, mas começa nele. Um produto que traz sempre algo maior e mais complexo do que ele em si.

A beleza do fazer artesanal começa no tempo, que é outro. É o tempo da mão, do homem, e portanto não pode haver lugar mais real. Seja no campo ou num ateliê, o dia de trabalho de um artesão não é ditado pelo tic-tac de um relógio de ponto ou pelas necessidades da produção, mas por um ritmo que tem mais a ver com o corpo e com sua sensibilidade.

“Enquanto trabalha, o artesão pode conversar com outras pessoas e até desatar a cantar”,escreveu Octavio Paz. E isso faz toda a diferença. O maior presente que estas vivências me dão é o de ver de perto processos produtivos cheios de vida, emaranhados com a natureza pulsante de cada lugar. Nestes contextos existe uma beleza essencial que nasce da relação íntima do homem com a terra, do homem com suas matérias primas singulares, do homem com suas mãos e toda história e conhecimento ancestral que o levou até ali. E a beleza desse entrelaçamento não é puramente estética, é a beleza do esmero, do cuidado e claro: uma beleza capaz de salvar o mundo.

Texto reproduzido do portal Hysteria

Rede Artesol


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Paula Dib, consultora da Artesol, é uma designer que há 15 anos se dedica a mergulhar nas comunidades tradicionais de artesãos do país para intervir de forma sensível no processo produtivo das associações.