Uma viagem pelo artesanato brasileiro
Das vilas de rendeiras à beira do Rio São Francisco, em Alagoas, às terras quilombolas do Deserto do Jalapão, os polos de produção do artesanato tradicional brasileiro são cercados de cenários protegidos, servidos de receitas típicas das quituteiras locais e embalados por muitas histórias, lendas e festas populares no interior do Brasil. Muitos designers do Páis tem viajado por essas comunidades tradicionais com a proposta de resgatar e reinventar técnicas seculares como a cerâmica, os bordados, a cestaria, entre outras expressões criativas do país. Na estrada, a ideia é pesquisar matérias-primas de diferentes biomas e aprender sobre os saberes tradicionais e o universo lúdico de artistas populares em vilas no sertão, nos pampas gaúchos, em reservas ecológicas na Floresta Amazônica e outros destinos inspiradores. Aproveitando as dicas destes profissionais, selecionamos sete roteiros para quem quer cair na estrada e conhecer mestres da cultura popular, arriscar oficinas de cerâmica em ateliês caseiros, experimentar a hospitalidade de pousadas domiciliares no Vale do Jequitinhona, celebrar a colheita do capim dourado no cerrado, ou dormir em um redário na floresta. Esses destinos podem ser explorados em viagens independentes, roteiros organizados por associações locais ou pacotes desenvolvidos por operadoras focadas em turismo de natureza. Os grupos fazem parte da Rede Artesol que, ao todo, já mapeou quase 100 comunidades tradicionais de artesanato no Brasil.
1 – Vale do Jequitinhonha
Abrigando um dos principais polos de cerâmica de Minas Gerais, o Vale do Jequitinhonha concentra diferentes comunidades de mulheres que se dedicam a modelar o barro ao ar livre, assá-lo em fornos de argila e transformá-lo em obra de arte e sustento. Através da técnica tradicional, elas retratam a paisagem, o universo lúdico do Vale e suas próprias feições em bonecas, muitas flores, rendas, rosas, santos, noivas e outros personagens que parecem saídos dos livros de Guimarães Rosa. O ponto de partida para um roteiro cultural por ali é a histórica cidade de Diamantina, encravada na Serra do Espinhaço. De lá, vale seguir até os vilarejos de Coqueiro Campo e Campo Alegre, que formam o núcleo criativo do Vale, onde as técnicas passadas de geração em geração tem sido reinventadas. Hoje a arte do Jequitinhonha é marcada por traços inconfundíveis e contemporâneos, atraindo designers de todo o País e até do exterior para residências artísticas. Além de conhecer os ateliês caseiros das “bonequeiras” e testemunhar o processo onde elas fabricam a cerâmica, quem chega à região encontra hospedagens como a Casa da Deuzani, com instalações simples e bem cuidadas, jardins muito floridos, portas sempre abertas e a mesa posta com café fresquinho, broas e biscoitos recém-preparados.
Serviço
Destinos: Diamantina e Turmalina (MG)
Receptivo domiciliar: Casa da Deuzani / (33) 99915 0520 / 99991
2 – Costa do Sauípe
A Costa do Sauípe é um destes estonteantes paraísos tropicais do Nordeste, onde os coqueiros se debruçam sobre o mar e os rios de água doce se misturam ao Atlântico em praias semi-desertas. È nesse cenário, pouco distante dos resorts do Porto de Sauípe, que os artesãos do pitoresco município de Entre Rios cultivam saberes ancestrais dos índios tupinambás, como as técnicas de trançar fibras vegetais das palmeiras de seus quintais. Com as mãos delicadas e ágeis, as mulheres aprenderam com mães e avós a colher, cozinhar, secar, tingir e trançar as folhas da palmeira para fazer as tramas de palha que deram origem aos famosos cestos da região. As criações também incluem bolsas, carteiras, tapetes chapéus de fibra de piaçava de fino acabamento e cores vivas. A Costa do Sauípe fica a 76 km de Salvador e possui uma ampla estrutura de hospedagem.
Serviço
Destino: Entre Rios/BA
Associação de Artesãos dos Trançados Tupinambá / (71) 9991-46837
Para visitar a associação, é preciso agendar.
3 – Sertão Alagoano
A rota Caminho do São Francisconasce no meio do sertão alagoano, uma terra de histórias de cangaceiros, vaqueiros, escultores e rendeiras que tecem a sobrevivência na soleira das janelas à beira do rio. O ponto de partida para conhecer as comunidades é o município de Piranhas, uma cidadezinha do século 18, que mais parece um presépio iluminado, com capelas no alto dos morros, estação de trem, casas coloridas e um centro histórico com ruas de pedra onde, ao cair da noite, o povo se junta para dançar xaxado, à beira do Velho Chico.A ideia do roteiro é, dali, seguir as curvas do São Francisco, desde os cânions do Xingó, até o rio desaguar no Atlântico, passando pelos por povoados de bordadeiras à beira do rio, escutando as histórias do sertão, navegando pelo rio, explorando dunas e desfrutando de um pôr do sol único. Entre as técnicas tradicionais mantidas na região estão os bordados da Ilha do Ferro, uma vila do período colonial que parece ter parado no tempo, delicados bordados boa noite e de bilro. Outro ponto alto do roteiro por ali é a Ilha do Ferro que tem impressionado curadores de arte pelo talento de escultores que entalham troncos de madeira com figuras da natureza. Na outra ponta da rota, Penedo é uma cidade com casario do século 18, onde as mulheres bordam as histórias, a arquitetura local e as lendas do São Francisco.
Serviço
Destinos: Piranhas, Entremontes, Ilha do Ferro, Penedo e Piaçabuçu.
Destino Alagoas / (82) 3028-6653
A operadora monta roteiros personalizados conectando atrativos culturais, naturais e gastronômicos.
4- Jalapão (TO)
Conhecido como o berço do popular artesanato de capim dourado, o povoado de Mumbuca, no Deserto do Jalapão, abriga 40 famílias de descendentes de quilombolas que hoje se dedicam quase integralmente a dar forma às hastes da delicada sempre-viva que se transformam em bolsas, brincos e peças de decoração. O vilarejo acolhe as visitas em uma hospedagem comunitária, a Pousada da Tonha, e o Restaurante Vila que oferece pratos típicos como a galinha caipira e a rapadura com buriti. O cenário do entorno é um dos mais exuberantes do Brasil: chapadões, cachoeiras cristalinas, piscinas naturais de águas esmeraldas e dunas alaranjadas de até 40 metros de altura se espalham pelo cerrado. O destaque fica por conta dos fervedouros, poços cristalinos que são dotados de nascentes subterrâneas borbulhantes, onde é impossível se afundar. Além de explorar o visual do entorno, no mês de setembro, os turistas são convidados a conhecer os campos de capim dourado e participar da festa da colheita (que este ano acontece entre 16 e 17 de maio).
Serviço
Associação do Capim Dourado / (63) 3576-1011 ou (61) 3327-8085
Durante a festa do capim dourado, as agências que operam o Jalapão incluem a festa em seus roteiros. Durante o resto do ano, é possível agendar um roteiro pela comunidade diretamente na Associação.
5- Alter do Chão (PA)
A cestaria em palha de tucumã é o cartão de visitas das comunidades amazônicas que ficam em praias desertas do Rio Arapinuns ou em vilas no meio da floresta. A partir das folhas do tucumã, tipo de palmeira bastante encontrada na Amazônia, os artesãos extraem a fibra usada para trançar vibrantes mandalas, cestas, potes, colares e bolsas com padrões geométricos únicos. As cores intensas vêm de pigmentos naturais produzidos à base de plantas locais, como a mangarataia e o jenipapo. Para conhecer a produção, a proposta é embarcar em um roteiro de turismo comunitário que inclui trilhas na mata, banhos nas águas esmeraldas do rio que parece mar, peixe assado na praia e oficinas de artesanato onde é possível até arriscar um trançado. A proposta é partir de Santarém para navegar pela bacia do Rio Tapajós durante quatro ou cinco dias parando em vilas como Uru e Vila Brasil. A hospedagem é em pousadas construídas com madeira e alvenaria, cobertas de palha, onde há um redário com o visual de 360 graus da floresta e muita brisa do rio.
Serviço
Turiarte: turiarteamazonia.blogspot.com.br / (93) 3067-8000
O tour é operado pela Turiarte – uma cooperativa de moradores locais – e pode ser feito em barcos de linha ou em uma viagem personalizada para grupos.
6 – Serra da Capivara
Os ceramistas da Serra da Capivara buscam na arte rupestre de mais de 10 mil anos a inspiração para as peças produzidas e pintadas manualmente em meio à natureza rústica da caatinga a poucos quilômetros do Parque Nacional que protege a região. Além de bonitas, as peças que, de alguma forma, contam histórias milenares dos povos ancestrais, são também resistentes e exibem um design moderno. Apesar das instalações simples, o polo de produção da cerâmica – no município de Coronel José Dias – é bem organizado e conta com uma cantina e um albergue para receber as visitas. Antes de seguir para o Parque, os turistas podem acompanhar o processo de modelagem, secagem e pintura das peças, que hoje são vendidas para todo o Brasil e para a Europa. No outro dia, os próprios artesãos indicam os guias que podem levar as visitas até o Parque Serra da Capivara. O lugar proporciona uma verdadeira viagem de volta às origens da civilização na América. As trilhas da unidade passam por cânions e grandes maciços de serras até chegar aos sítios com uma enorme concentração de arte rupestre pré-histórica (as pinturas têm entre 6 e 12 mil anos). Para quem preferir, pode se hospedar no município vizinho de São Raimundo Nonato, onde se encontram associação de guias e opções de hospedagem mais estruturadas, transporte e alimentação.ServiçoCerâmica da Serra da Capivara(89) 3582-1949
Serviço
Cerâmica da Serra da Capivara
(89) 3582-1949
7 – Pampas gaúchos
Pouco explorado turisticamente, os pampas gaúchos guardam as memórias dos tropeiros, uma atmosfera nostálgica e a tradição de tecelagem com lã pura de ovelha. O principal roteiro da região é oCaminho Farroupilha, que conecta fazendas de criações de ovelhas, experiências gastronômicas focadas no charque, degustação de vinhos e conhecendo tradicionais tecelagens. No mês de setembro, quando os gaúchos comemoram a Semana Farroupilha é a melhor época para explorar a região e refazer os caminhos que levaram os gaúchos republicanos a declararem guerra ao Império do Brasil. Um dos programas é visitar o pequeno municipío de Dom Pedrito, que faz limite com o Uruguai e concentra tecelãs que já desenvolveram coleções com grandes designers brasileiros como Ronaldo Fraga e Renato Imbroisi. Na propriedades rurais do município, os visitantes podem acompanhar parte do minuncioso trabalho das artesãs que vai desde a extração da lã, até o processo em que ela é fiada, tingida com pigmentos naturais e depois de feltrada no tear.